Dir: Luiz Bolognesi
Elenco: Selton Mello, Camila Pitanga e Rodrigo Santoro
Uma História de Amor e Fúria é uma animação nacional
lançada esse ano, 2013, que conta a história de um sujeito sem nome que cruzou
em uma única vida seis séculos na tentativa de ficar junto da mulher que ama:
Janaína.
A primeira vez que encontramos o cara identificado como “Guerreiro
Imortal”, dublado pelo competente Selton Mello, é em um Rio de Janeiro distópico
e futurista, uma paisagem desolada e metálica em um tempo em que a água é tão
escassa que seu roubou é crime passível de execução.
O cara está à beira de um prédio, pronto para pular, com
uma mulher ao seu lado. Então, antes de seu salto para a morte, ele decide nos
contar sua secular jornada.
Tudo começou séculos atrás, pouco antes da chegada dos
portugueses ao território que futuramente seria o Brasil.
Aqui vemos a primeira caçada de um índio que, para se
tornar um guerreiro, um homem, precisa matar uma onça como rito de passagem. E,
junto de sua amada, quando encontra a tal onça, tudo o que o cara consegue
fazer é sair correndo junto com a moça até que os dois se veem à beira de um
penhasco e, perdendo todas as esperanças, decidem pular.
Milagrosamente, segurando sua amada ao seu corpo, o índio
alça voo e os dois se salvam.
Essa experiência fez com que o pajé revele ao jovem índio
uma antiga profecia sobre um homem que seria capaz de voar e seria incapaz de
morrer até que enfrentasse uma entidade maligna e impedisse que essa dominasse
o mundo dos homens, não importando quanto tempo isso levasse.
A entidade se chama Anhangá, uma lenda indígena, um
espírito impuro e cruel que se personifica em qualquer um que traga destruição
e morte.
Essa entidade se apresenta na forma da chegada dos
portugueses, que massacram o povo do jovem guerreiro e, por fim, matam sua
esposa, forçando-o a transformar-se num pássaro e voar sem parar durante
séculos e séculos até o dia em que a reencontre e possa mais uma vez estar nos
braços de sua amada.
“Uma História” acompanha a jornada desse herói sem nome
no decorrer de seis séculos de civilização brasileira, passando pela colônia,
pela escravatura, pela ditadura até chegar no futuro distópico que eu mencionei
no começo. Todas as vezes em que o sujeito se encontra com a tal Janaína
(sempre dublada por Camila Pitanga), ele sente a presença de Anhanguá e a perde
de uma forma trágica.
Isso acontece várias vezes nesses seis séculos e ele
sempre acaba da mesma forma: transformando-se num pássaro e voando sem rumo.
A arte de “Amor e Fúria” é irregular: mistura animação 2D
com CGI de uma forma incômoda, estilizada demais e bastante incomum. Não é
agradável à primeira vista e, durante seus 70 minutos, só se torna fácil de
engolir, não fica mais agradável. É bonita, faz um bom uso de cores e efeitos,
mas a arte em si é quase ruim. A narrativa é lenta, parece muito mais longa do
que realmente é (dos 70 minutos, 10 são de créditos e um é de propaganda da
Petrobrás), chega a ser cansativa, principalmente pela repetição de elementos. A
ideia em si é fantástica, quase um Fonte da Vida com elementos indígenas e
abordando a história do Brasil, sem poupar críticas a nossos “heróis”
nacionais, sem meias palavras, sem censura. Há nudez, há violência gráfica
(ainda que grande parte dela seja fora de câmera mais por estilo que por outra
razão) e há um drama muito bem pensado, porém mal desenvolvido.
A beleza de “Amor e Fúria” está na concepção de seu
protagonista que, sempre que vira um pássaro e retorna, sofre mudanças em sua
aparência, sem perder sua identidade visual. O cara começa índio e termina
caucasiano. Enquanto sua amada começa e termina, encarnação após encarnação,
com o mesmo rosto (claramente baseado no rosto da atriz que lhe dá voz). Há uma
metáfora bacana aí e, por envolver o elemento indígena, não fica ridículo nem
apela para o espiritismo barato de novela das oito.
Amor e Fúria tem seus defeitos, tem uma execução frágil e
uma ideia muito boa que se sobrepõe a seus defeitos, mas não consegue sozinha
fazer dessa uma produção competente.
Há muito para se evoluir na animação nacional, mas é tão
interessante ver uma que opta por contar uma história tão incomum para o cinema
de animação nacional e se leva a sério ao fazer isso, que eu acabei fazendo uma
série de pequenas concessões e relevando um bocado de problemas menores. Se
formos somar um mais um, no fim das contas, o saldo de Amor e Fúria acaba positivo.
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