quinta-feira, abril 25, 2013

O Dia Em Que Faremos Contato - Lenine, ou: "Tem Vez Que Só Mesmo A Lei Do Cão".

Michel 109. Dia 114.

Lenine é um cara incrível. Junto com o Zeca Baleiro e o Chico César, é um dos nordestinos dobradores-de-palavras mais poderosos desta terra seca que é nossa casa e refúgio e sina. Dos três, ele é o mais literal em sua poesia, mas isso não o desmerece de maneira alguma.


Mas falemos de Lenine e seu disco que mescla o urbano e o sertão de uma maneira místico-eletrônica. Ele é como um profeta destes tempos atuais, que canta o amor mas não esquece de destruir os falsos ídolos da mediocridade. Em "O Dia Em Que Faremos Contato" ele critica as tendências sem perder as origens; ele combate as modinhas sem desmerecer quem não merece; ele equilibra a balouçante balança norte-sul com o peso de suas canções e rimas e sentidos. 


Lenine é único. Sua música em "... Contato" tem gosto de terra seca, de poeira, de mangue, de mar, maresia, promessa e saudade de chuva. Sua música louva, idolatra, adora, ama, toca, penetra a essência do feminino. A mulher cantada por ele - morena, magra, de olhos negros de raios-x - é a forte mulher nordestina que não se entrega ao desespero nem quando o seu homem arrega.

Lenine é visionário. Mescla guitarras, música eletrônica e percussão em ritmos nordestinos numa confuvulsão(TM) de sonoridade que soa ao mesmo tempo alienígena e extremamente familiar. 

Quem somos vocês, pergunta o astronauta perdido numa Terra estranha.


O amor declarado ao cangaço neste disco é outra característica. Misturar a estética marciana à caatinga é uma jogada de mestre realizada com maestria por Lenine. Nosso planeta vermelho está bem aqui, no Nordeste do Brasil. 

E temos o Lampião, o Candeeiro Encantado.

"Aí eu fui na fazenda do coiteiro que traiu Virgulino e cortei onze cabeças à facão.
Depois meti tudo num saco e mandei de presente pro delegado, com um bilhete escrito à sangue.
Era o meu troco, pra mostrar pra eles que eu tava na guerra pra vingar Lampião, mas a cabruêra deu pra trás, cego Júlio.
E eu fiquei sozinho..." 
Corisco, em "Deus E O Diabo Na Terra do Sol", de 1964. Dirigido por Glauber Rocha. Incidental numa das músicas mais fodas de todos os tempos: "Candeeiro Encantado".

Um herói, um bandido, um vilão, um vingador. Um orgulho, uma referência, um valor. Meu Candeeiro Encantado, a encarnação da violência do sol inclemente e da terra seca na vida do sertanejo. Lampião eternizado em filmes, livros, poemas e cordéis. A crueza da morte e da sobrevivência que transformam o ser humano num bruto selvagem, mas que não perde o contato com a divindade que lhe protege e atende e castiga.

Dá-lhe, Lenine. No dia em que fizermos contato, nomear-te-ei Embaixador Musical do Sertão nas Planícies Marcianas. Neste dia, os sertanejos que sofrem com a falta d'água e tudo de ruim que vem com isso finalmente serão ouvidos por alguém, e o que é vermelho e estéril será, mais uma vez, um paraíso. 


Boa noite, e que o fim de semana se aproxime com a velocidade do sono dos cansados e o poder de recuperação do dormir das crianças.

Até.

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