Dia 102 - Felipe Pereira 98
Gattaca - 1997
Dir: Andrew Nicol
Elenco: Ethan Hawke, Uma Thurman, Gore Vidal.
Gattaca é uma daquelas ficções científicas geniais,
aquelas que ficam imortalizadas, imperecíveis. Alien, Matrix, Blade Runner,
filmes que simplesmente não envelheceram um dia desde sua concepção.
A história se passa num futuro próximo onde os casais
escolhem cada característica que querem em um filho, desde a cor dos olhos à
probabilidade da criança sofrer de doença degenerativa ou dependência química
quando atingir a vida adulta. Nesse futuro uma grande corporação de
recrutamento para missões especiais, Gattaca, (algo como a NASA com esteroides)
escolhe geneticamente só os melhores e mais aptos seres humanos para mandar a
suas missões exploratórias, apenas pessoas “bem feitas” no sentido genético da
coisa. E é nesse mundo da perfeição quase nazista que nasce o protagonista de
Gattaca, Vincent Anton (Ethan Hawke, que demora a acertar um bom filme, mas
quando o faz é pra ficar pra história). Apenas Vincent, por ser indigno de
herdar o nome do pai.
O sonho de Vincent desde pequeno sempre foi ir ao espaço,
fosse pelo seu fascínio pelo que há do lado de fora da Terra ou pelo seu
desprezo pelo que há do lado de dentro, essa era sua meta, esse era seu
principal e inatingível objetivo.
Tudo por que, em um mundo no qual ser perfeito é
obrigatório para se chegar a um lugar de destaque, os pais de Vincent optaram
por concebê-lo à moda antiga, sem manipulação genética, acreditando que apenas
o amor seria suficiente para dar a eles um filho perfeito e totalmente
saudável.
O resultado...
Vincent era um fracasso, tinha um coração tão fraco
quanto um fio de cabelo, pré-disposição a vício em drogas, doenças
neurológicas, problemas de atenção, na melhor das hipóteses ele duraria trinta
anos e morreria de gripe.
O que seus pais fazem a respeito? Aprendem a lição e
recorrem à manipulação genética para ter um filho que durará um par de anos a
mais que Vincent. E esse sim herda o nome do pai.
Mas Vincent é decidido, não abriria mão facilmente de seu
sonho e, por mais piegas que isso possa parecer, ele faria de tudo para realiza-lo.
Ele mentiria, ele falsificaria documentos, ele
falsificaria células...
Ele mataria?
O que acontece é que o cara fica sabendo de um sujeito
que vende oportunidades aos seres humanos de capacidades inferiores. O lance do
sujeito era transformar os fracos em invencíveis por meio de falcatruas
incrivelmente arquitetadas. Nesse ponto ele apresenta Vincent a Jerome Morrow (Jude
Law). Um nadador com uma saúde inabalável, um coração implacável, praticamente
um imortal. O único problema é que ele se envolveu em um acidente que tirou-lhe
a capacidade de andar.
O plano é fazer com que Vincent se passe por Jerome, por
meio de truques que envolvem forjar amostras de sangue, urina, cabelo, pele,
etc... O pagamento seria 25% mensais do que Vincent, que daquele momento em diante
passaria a se chamar Jerome, recebesse em Gattaca. 25% nas mãos do falsário.
Bolsas de urina, pontas de dedos falsas com bolsas de
sangue ocultas, pelos, cirurgia dentária, impressões digitais, lentes de
contato, amostras de pele e, no fim, nada disso seria suficiente para
transformar Vincent em Jerome, um ser humano geneticamente superior. Tudo por
que Jerome é visivelmente mais alto que Vincent. Aí vem o próximo passo:
cirurgia de alongamento. Isso mesmo, o cara faz uma cirurgia pra ficar mais
alto.
Desse momento em diante Jerome é um ser humano perfeito.
Mais que isso, um ser humano exemplar, o topo da cadeia genética (gostou
dessa?). Não demora até que, com todas as qualificações que não são suas, ele
entre para Gattaca e, em poucos anos, seja mandado para Titã numa missão
pioneira rumo à nebulosa lua de Vênus.
Isso se não morrer antes.
As pessoas mais necessitadas de mensagens altruístas encaram
Gattaca principalmente como uma crítica mordaz aos atuais padrões socialmente aceitáveis
de beleza e perfeição, o que não deixa de ser verdade, eu admito e concordo. Mas
reduzi-lo a isso é quase criminoso. Fazer crítica à sociedade consumista e
opressora todo mundo faz. Agora fazer uma ficção científica elegante e
atemporal como Gattaca é trabalho para poucos. Misturar esse gênero a romance,
drama e thriller então... Trabalho de mestre.
Vincent/Jerome torna-se tão obcecado em atingir ou fingir
a perfeição que cada passo seu passa a ser pensado, cada fio de cabelo que cai
é recolhido, a pela morta que se desprende de suas mãos é aspirada e
substituída pela pele morta do verdadeiro Jerome de forma a parecer algo
totalmente comum. E ele passa anos em Gattaca, totalmente acima de qualquer
suspeitas, a qualquer um que perguntassem, Jerome é tão perfeito quanto finge
ser.
Até que, faltando poucos dias para a viagem à Titã, um
dos diretores da instituição descobre o segredo de Jerome. Descobre que ele não
é quem diz ser. E o mesmo diretor aparece morto dias depois. O lance é que isso
é logo no começo do filme e a morte do diretor, ou o fato dele ter descoberto a
verdade sobre o inválido Vincent Anton, são os menores dos problemas do cara. A
investigação recorrente da morte é que vai fazê-lo passar por maus momentos,
provações impensáveis, descobertas atordoantes até chegar ao fim de sua jornada
com um dos finais mais épicos de uma ficção científica moderna. Dois finais
épicos, na verdade, por que o final alternativo é espetacular e totalmente
inesperado. É difícil escolher qual é melhor.
O diretor Andrew Nicol conseguiu em sua carreira conceber
dois trabalhos incríveis: Gattaca e O Senhor das Armas, um filme excelente com
o NICOLAS CAGE!!!! O que veio entre esses dois e o que veio depois deles é
totalmente descartável ou execrável, coisa para não se ver mesmo. Estou
esperando o dia em que Nicol voltará a ser criativo e drástico como nessas duas
obras, um dia que eu nunca deixarei de esperar!
Por hora, ficamos aqui, apreciando suas obras passadas,
seus trabalhos fantásticos.
E Gattaca é algo no mínimo fantástico.
PS: as crianças de hoje jamais saberão que Plutão um dia foi um planeta...
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