domingo, março 10, 2013

Líricas - Zeca Baleiro, ou: A Poesia Ainda Mora Aqui

Michel 65. Dia 69.
Zeca Baleiro é um Mestre das Letras. Junto com Chico César, os dois compositores têm um domínio sobrenatural sobre aquilo que escrevem, fazendo o que querem com as palavras/ideias/conceitos contidos em suas músicas.

"Líricas" (2000) é o terceiro disco de estúdio de Zeca. Aqui vemos um compositor atento, carinhoso e sereno destilar suas músicas e jogos de palavras como antes ainda não havia feito. As músicas têm uma qualidade romântica e delicada, mas sem perder o sarcasmo e o hedonismo sempre tão presentes na poesia deste maranhense de óculos redondos. Sua visão de mundo é clara e suave, dando ao disco inteiro uma textura acústica e sensível, contando com a presença de instrumentos mais clássicos.


E quando o cara transforma uma música do Charlie Brown Jr. numa obra de arte, é porque:

a) A música tinha qualidades em si que se mantinham insuspeitas sob a superfície de um rock superficial;
b) O cara é um gênio da música;
c) Todas as anteriores, apesar das limitações patentes da música original.

Enfim...

Um disco excelente, com momentos marcantes e profundos, de uma suavidade sólida e viciante. O disco que me fez virar fã de Zeca definitivamente.

Atenção, muita atenção às faixas: "Minha Casa" (Uma ode ao incorfomismo... perfeita); "Proibida Pra Mim" (de como uma larva pode se transformar numa imponente e colorida borboleta... se é que você me entende, para não ferir os sentiementos dos recentes fanboys-comedores-de-carniça); "Babylon" ("... minha religião é o prazer"... não precisa dizer mais nada sobre esse Hino, precisa?); "Nalgum Lugar" (Um dos mais belos poemas que já vi na vida, de E. E. Cummings, musicado de maneira PERFEITA e DEFINITIVA por Zeca. Se a música tivesse sozinha do disco, já valeria. Uma das poucas músicas capazes de encher meus olhos de lágrimas e meu coração de uma angústia extrema); "Quase Nada" (O hit do disco, a mais tocada, mas nem por isso ruim); "Você Só Pensa Em Grana" (um tratado sobre o capitalismo dos relacionamentos); e "Blues Do Elevador" (triste... tão triste reflexão acerca da solidão).

Um disco pleno de Zeca Baleiro, rico e versátil, mas cheio de identidade. As músicas casam-se perfeitamente com a proposta do disco, causando no ouvinte um sentimento quente e úmido de solidão compartilhada.

Resumindo, um trabalho excelente de um artista excepcional. Em minha opinião, o melhor trabalho de Baleiro.


Nalgum lugar em que eu nunca estive
Alegremente além
De qualquer experiência
Teus olhos tem o seu silêncio
No teu gesto mais frágil
Há coisas que me encerram
Ou que eu não ouso tocar
Porque estão demasiado perto
Teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
Embora eu tenha me fechado como dedos
Nalgum lugar

Me abres sempre pétala por pétala
como a primavera abre
Tocando sutilmente, misteriosamente
A sua primeira rosa
Sua primeira rosa

Ou se quiseres me ver fechado
Eu e minha vida
Nos fecharemos belamente, de repente
Assim como o coração desta flor imagina
A neve cuidadosamente descendo em toda a parte
Nada que eu possa perceber neste universo
Iguala o poder de tua intensa fragilidade
Cuja textura
Compele-me com a cor de seus continentes
Restituindo a morte e o sempre
Cada vez que respirar

Não sei dizer o que há em ti que fecha e abre
Só uma parte de mim compreende
Que a voz dos teus olhos
É mais profunda que todas as rosas
Ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas (2x)

Ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas.

Deixo vocês com A Música que define o disco, e com A frase: "Ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas".


Tenham todos uma boa noite e um bom início de semana. Que o Zeca Baleiro possa sempre estar com vocês. Abraços do Ladrão de Almas.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado por comentar no 01Pd! Seja bem vindo e volte sempre!