quinta-feira, outubro 09, 2014

O Lobo Atrás da Porta

O Lobo Atrás da Porta, 2013
Dir: Fernando Coimbra
Elenco: Fabiula Nascimento, Milhem Cortaz, Leandra Leal



Pode parecer mentira, mas existe uma vertente do cinema brasileiro que preza pela qualidade e pela inteligência do público.
E, pode parecer ainda mais incrível, mas é uma parcela relativamente grande do que é produzido em solo nacional. Apesar de sua qualidade, essa fatia é constantemente ofuscada por produções baratas de gosto duvidoso. Filmes do Leandro Hassum e do Marcelo Adnet. Temos atrás, cheguei a afirmar que o cinema brasileiro encontrava-se em estado de putrefação decadente. Não volto atrás nessa afirmava, visto que, se tirarmos pelo que vemos chegar ao grande circuito comercial, basicamente o que preenche as telas de nossas gloriosas salas é putrefação e decadência.
Porém, há aquela parcela que mencionei a pouco. A parcela que se esforça para provar que há vida inteligente e bom gosto em nossos filmes. Uma parcela que nada deixa a desejar se comparada ao cinema europeu ou americano.
E nem mesmo é uma parcela assim tão pequena!
Um dos expoentes mais recentes do bom cinema brasileiro se chama O Lobo Atrás da Porta.
O Lobo acompanha o interrogatório de um casal (Fabiula Nascimento e Milhem Cortaz) cuja filha foi sequestrada sem motivo aparente. O casal depõe separadamente. Primeiro a esposa, que conta que chegou à escola da filha para levá-la para casa e descobre que alguém chegou e levou a menina embora. Depois é a vez do marido. E é aí que as verdades inconvenientes começam a surgir: o cara acaba revelando ter uma amante (Leandra Leal) fora do casamento. E a tal amante pode vir a ter envolvimento com o sumiço da menina. A história toda, de todos os lado, é muito mal contada, não dá pra acreditar em ninguém.
Ainda há o depoimento da professora da menina que revela mais uma coisa ou outra. Mas as coisas começam a degringolar mesmo quando chega a hora da amante depor.
Durante todo o período anterior ao depoimento da amante, a história se conta em cortes rápidos, mostrando superficialmente o que levou àquela situação. Quando a dita cuja começa a falar, o filme começa de verdade. Ela conta detalhadamente como conheceu o cara, como se envolveu com ele, como reagiu ao descobrir que ele era casado, que tinha uma filha, e por aí vai.
O lance é que O Lobo foca nisso de uma forma que dá a entender que ele vai terminar sem uma conclusão. E é nesse ponto que a magia acontece!
O Lobo Atrás da Porta tem sua complexidade, mas, no geral, é um filme bem simples. É sobre ação e reação. Causa e consequência.
E, mesmo assim, em toda sua simplicidade, é possível fazer uma análise profunda da capacidade humana de se afundar na desgraça. Traição, vingança, mentiras, violência... Cada decisão tomada, cada ação contada, cada movimento feito é um golpe forte que machuca na ferida de alguém. Ninguém sai intacto, ninguém sai impune e todo mundo se machuca. O Lobo é sobre confiança ferida, sobre amores fingidos e corações partidos. Um roteiro tão absurdo quanto crível, que se encaixa assustadoramente na nossa realidade atual. Não há outra forma de descrever que não "devastador".
É necessário mencionar aqui a participação do delegado na coisa toda: o cara interroga todo mundo de uma forma sensacional. O ator Juliano Cazarré estava tão à vontade no papel que chegou a roubar a cena. E olha que o elenco não é pouca coisa.

A parte técnica do filme preza pela simplicidade: uma fotografia limpa, a direção eficiente de Fernando Coimbra em seu primeiro longa (o que só torna as coisas ainda mais impressionantes), atuações convincentes. A edição de som é peculiar: ela é o padrão nacional, aquela que você precisa se esforçar um pouco pra entender o que os atores estão dizendo. Mas em certos momentos chave, como a cena conclusiva do longa, ela se mostra primorosa.



Um comentário:

  1. Hmmm...
    Só vocês mesmo para me fazerem interessar por um filme nacional de novo.
    Parabéns pela analise, me aguçou um desejo de conferir, assim que conferir, comento aqui!

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