domingo, novembro 03, 2013

Gravidade

Dia 307
Gravity - 2013
Dir: Alfonso Cuarón
Elenco: Sandra Bullock, George Clooney, Ed Harris (voz)

Gravidade é uma experiência fantástica, uma mescla de pop e clássico em uma ficção espacial (não é só por que se passa no espaço que se trata de uma ficção científica) visualmente impactante e com uma execução impecável.

Na trama acompanhamos Matt (George Clooney) e Ryan (Sandra Bullock), astronautas em seu último dia de missão que se veem em uma situação extrema quando uma onda de destroços, oriundos da destruição de um satélite espião russo, origina uma reação em cadeia na órbita da Terra, destruindo todos os satélites e estações vizinhos e colocando em risco a missão e a vida dos dois.
Desse momento em diante, Matt e Ryan precisam percorrer o espaço, lutando contra condições miseráveis, em busca de refúgio contra a onda que arrasa o que há pela frente em intervalos regulares de tempo. Assim como os astronautas, os satélites e a estação internacional, a onda de destroços também está em órbita, a uma velocidade absurda e em direção contrária a eles, destruindo, a cada nova aparição, qualquer esperança dos dois em voltar para casa com vida.

Exagerando bastante, mas não desmerecendo, é possível comparar o novo trabalho de Alfonso Cuarón a 2001: Uma Odisseia no Espaço, com o diferencial de que, apesar de suas inúmeras metáforas existencialistas, o filme do mexicano é mais realista e menos viajado que o de Stanley Kubrick. Todas as metáforas e discussões levantadas em Gravidade se mantém dentro de um contexto mais “pé no chão”, o que não o torna nem melhor nem pior que 2001. Na verdade, apesar de visualmente semelhantes e da temática espacial, é preciso se ter em mente que não há muito em comum entre as duas obras.
Há mais em comum com Matrix, por exemplo: os dois agradam tanto a públicos mais cultos, quanto a públicos que só procuram entretenimento (segregação intelectual, hell yeah!).

É quase impossível se aprofundar em Gravidade sem dar spoilers, apesar de que eu acho que, no caso desse filme, quanto maior a quantidade de informações que se tiver a seu respeito antes de se assistir à obra, mais ampla será sua experiência. Outro fator importante para uma melhor absorção é a falta de expectativas. Gravidade pede que o expectador se livre das suas, caso contrário pode ocorrer, assim como ocorreu comigo, uma espécie de decepção, mas não algo negativo.
Ficou confuso. Gravidade decepciona?
Não, pelo contrário. O que acontece é que a história toma rumos tão inesperados que o expectador fica sem chão, fica sem ter ao que se agarrar. E, em certo momento, com a morte de uma personagem importante de forma muito prematura, a sensação que se tem é a de que não se faz ideia dos rumos que o longa irá tomar, o que te obriga a se deixar conduzir pelas ideias de Cuarón.

A grande surpresa em relação à trama se deve, em grande parte, também à expectativa, a ideias preconcebidas. Explico: quando cheguei no cinema para ver Gravity, o que eu esperava era um filme lento, introspectivo, que falasse com um público específico, um público mais cult, menos pop. A surpresa veio primeiramente ao ritmo: apesar da lentidão de movimentos, da falta de gravidade, apesar do andamento comedido, o ritmo do filme é frenético, desesperador. A todo momento tem um acontecimento inesperado, a todo momento tem algo que muda as variáveis, sem falar na ameaça iminente da onda de destroços. Apesar disso, o roteiro não se prende a soluções fáceis, nem reviravoltas preguiçosas. Dá pra ver o esmero, a paciência, o empenho em se escrever um texto surpreendente, dá pra ver que Cuarón e seu filho, Jonás Cuarón, não pararam enquanto não entregaram um trabalho que não fosse menos que grandioso. E ver isso em um filme, um tão bonito visualmente e tão poderoso em suas ideias, é algo lindo. Ver que todas as partes envolvidas estavam dando o máximo de si para fazer algo inesquecível, é fantástico.

Ao mesmo tempo em que é frenético e angustiante, Gravidade é belo e emotivo, explora as cicatrizes de seus protagonistas, principalmente da personagem de Bullock, que perdeu a vontade de viver após a morte da filha e desiste da própria vida naquela situação. Então além de enfrentar as situações extremas nas quais se encontra, Ryan precisa enfrentar a si mesma e ao seu medo, sua fraqueza, seu desespero...
Se em 2001 Stanley Kubrick nos deu a entender que o espaço era um útero, aqui Cuarón se apodera dessa ideia e a potencializa em todas as suas metáforas.
Gravidade não é sobre o espaço, a fronteira final, não é apenas sobre estar perdido e isolado, não é apenas sobre estar longe de casa. É sobre força, sobre vida, é sobre reencontrar a si mesmo em um lugar onde ninguém vai atender seus gritos de socorro. É uma jornada do herói com uma dose de coragem. É sobre morrer e sobre renascer.

E não bastasse tudo isso, ainda há um cuidado com o visual e com o sonoro que chega a ser tocante. Não há som no espaço, então a única coisa que ouvimos aqui durante grande parte do tempo é uma trilha sonora poderosíssima, um trabalho de mestre por parte do compositor Steven Price em seu primeiro trabalho de grande projeção. E não esqueçamos da absurda fotografia de Emmanuel Lubezki (o mesmo do fantástico A Árvore da Vida), que lida com escuridão e com luz como ninguém e que é, por si só, mais uma das inúmeras metáforas da obra.

Pra finalizar: Gravidade é único, algo que merece ser visto na maior tela possível, que vale o 3D e que faz uso desse como uma ferramenta visual, como um recurso de fotografia, não como pirotecnia para pessoas impressionáveis. Se você não viu ainda, veja! Mas antes disso, dispa-se de expectativas, vá de mente aberta, de cabeça limpa e veja um dos filmes mais poderosos de 2013.

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