Janiê Maia 16 Dia 204
Semana
passada estava meio sem motivações para resenhar sobre filme algum, crises existenciais!
Mas eis que surge um filme em minha mente, o nome de um longa que afirmei que
estava imensamente curiosa em assistir. Por que o trailer tinha me deixado no
mínimo interessada, havia visto na TV, não pude ir ao cinema conferir, então
cacei via internet. E aqui estou para compartilhar com vocês o belíssimo filme
em questão. Posso considerar que fiquei um pouco receosa no início, afinal pela
sinopse pensei que iria assistir um filme repleto de sexo e violência, clichês de
hollywood. Só que surpresa é a palavra-chave, me surpreendi galera, vejamos as
razões.
Segredos de Sangue (título
brasileiro), Stoker (título original,
é o sobrenome da família em questão), é um filme americano recém lançado, precisamente
em 14 de junho de 2013, foi dirigido por Park
Chan-Wook. E estrelado por Mia
Wasikowska, Nicole Kidman e Matthew
Goode. Daqui você já pode ter um referencial:
sangue, família, DNA e segredos. São esses elementos que norteiam toda a trama
do filme, ultimamente tenho obtido sorte por assistir filmes bons, quer dizer
excelentes.
Desde os
primeiros segundos do filme você já sente o clima de suspense no ar, cortes de
câmera congelada, letreiros visto ao contrário que deixam a tela lentamente,
como se morressem ao ar. E nossa protagonista India Stoker (Mia
Wasikowska) é o primeiro personagem que vemos de uma
maneira um tanto sinistra. India se
encontra na beira de uma estrada deserta, o carro parado, olhando aparentemente
para o nada, este início é o começo do fim do filme (vocês entenderão quando
assistirem). Pronunciando frases não convencionais, meio sem nexo, começamos a
entender o jeito de nossa heroína: meus ouvidos ouvem o que os outros não
ouvem. Vejo coisas pequenas e distantes que normalmente não são vistas. Esses
sentidos são frutos de uma vida de anseios, anseio de ser resgatada e completada.
Após
esse desabafo solitário, é visto um bolo de aniversário, juntamente com o som
de uma colisão de um carro, é o segundo ponto norteador da história, a vítima é
(Richard) o pai de India, que vem a
falecer tragicamente no dia do aniversário de 18 anos dela. Daqui se desenrola toda a atmosfera angustiadora na tela, por ter
uma ótima relação com o pai, a mesma não se conforma, triste e solitária, ela
sempre foi só, filha única, sente a dor da perda de sua maneira, diferente. Vela
o corpo inerte de seu pai como um pesadelo, não acredita naquilo. E é durante o
enterro que surge o belo, charmoso e misterioso tio Charlie (Matthew Goode), irmão de seu pai, que depois de uma
suposta temporada na Europa, volta repentinamente para velar seu irmão. Este
início perfeito já chama atenção de forma bem pretenciosa, a partir daqui você
gruda os olhos na tela esperando o desvendar dos segredos.
Evelyn (Nicole
Kidman) é a belíssima viúva, é uma mãe mais preocupada com a beleza que se vai
com o avançar da idade do que com a própria filha. Por ser uma bela mulher e
sabe disso como ninguém, usa todo seu charme para ser uma ótima anfitriã para o
irmão de seu falecido marido. E Charlie se
aproveita disso muito bem, seduzindo-a, ganha sua confiança como ninguém para
colocar em prática um propósito bem maior. Ele observa a sobrinha, rodeia seus
passos. A partir daí outros parentes surgem para tentar conversar com Evelyn sobre o misterioso Charlie, mas a mesma tão encantada nem
dá atenção. E esses parentes assim como surgiram desaparecem como fumaça. Já
podemos notar neste capítulo do filme que há assassinatos bem elaborados, sem
rastros. E India? Ela no início não
aceita a amizade de Charlie, mas no
decorrer da história inclina-se a se sentir semelhante a ele.
Estas
semelhanças são a frieza, o modo como observam as coisas, afinal é seu parente,
há alguma ligação entre eles. Evelyn é
altamente frustrada por saber que sua filha é diferente, sua normalidade que
deveria chegar aos 18, nunca irá acontecer. Seu marido se preocupava mais com India do que com ela, a proximidade era
tão grande que os dois saiam a caça, sim, ele a ensinou a caçar animais de
forma extraordinária, uma matadora nata, como se aquilo estivesse em seu
sangue. Richard prepara sua filha
para algo pior, como se estivesse prevendo que um dia algo de ruim iria
acontecer, este é o maior segredo. Ás vezes temos que fazer algo ruim para
evitar o pior; na fala do pai. Essa coisa ruim era a caça, ele não
gostava daquilo, fazia por sua filha, por um propósito que escondia de forma super
secreta.
Tal
criatividade é um dos diamantes deste sucesso, o diretor soube impor seu estilo
de cinema em terras americanas, sem perder nenhum resquício de originalidade. O
roteiro não é de sua autoria e sim do bonitão tatuado de Prison Break, quem
diria que Wentworth Miller produziria
um roteiro tão bem elaborado, aliás seu primeiro roteiro, está de parabéns, um
ótimo começo. O resultado desta parceria é uma película altamente perturbadora,
com cortes de câmera na hora exata, cores mortas ambientando uma belíssima
fotografia, lâmpadas acendidas com fantasmagorias e diversas metáforas. O som
das cascas de ovos sendo rompidas, uma aranha subindo pelas pernas, o estalar
de cintos, o som cru dos passos pela casa, elementos infantis como um
escorregador e balanços, sorvetes e uma erótica cena no piano!
Todos
estes elementos são importantes metáforas para mostrar um desabrochar de uma
adolescente, que se vê rompendo com uma normalidade que nunca terá, por que lhe
é incrustada uma natureza fria e selvagem em seu sangue. O nascimento da
sexualidade quando encontra na figura de um belo estranho, o despertar de sentimentos nunca experimentados. Há uma belíssima cena em que India e Charlie compõem um dueto ao
piano, lado a lado, ao mínimo tocar dos corpos é exposto um singelo erotismo, é
uma cena muito bela por não ser apelativa.
O piano
aliás é maravilhosamente o protagonista de toda a trilha sonora do filme. Que
por sinal é marcante por refletir todo o ambiente de inquietação presente, é
confuso e sombrio. Os fabulosos diálogos, bastante intrínsecos com o agir dos
personagens, a troca de olhares, gestos sutis, tudo isso é bem visível. Aqui o
óbvio não é o carro chefe, e sim o sutil, a figuração, as metáforas aleatórias
tem sua ordem, em um mundo fictício que parece ser um caos onde o sangue é o
grande organizador.
A
química presente entre os atores contribui grandemente para a formação desta
obra-prima (não é todo filme que vai para meu seleto time). Mia Wasikowska interpreta de uma forma
brilhante, como imã nos atrai a cada gesto, está soberba, está quase
irreconhecível. Depois do sucesso de Alice
no País das Maravilhas, Mia interpreta uma personagem bastante complexa.
Afirmo que este é seu tom perfeito, o drama e suspense se encaixaram perfeitamente
à ela, deveria se arriscar mais nesta linha. Sua atuação é natural, não forçada
ao compor uma garota em plenas mudanças.
A cumplicidade
com Matthew Goode é admirável,
havendo uma atração sexual e uma cumplicidade entre seus personagens bem sagaz.
Goode não é um ator muito conhecido
do grande público, mas com certeza já viram ele em comédias românticas, dramas
e participações especiais. Mas em Stoker
obteve sua grande chance de mostrar seu talento e o faz magnificamente,
garantiu seu lugar em Hollywood. E o que falar de Nicole Kidman? O de sempre, excelente atuação, na medida certa, se
joga no personagem sem medo algum em mais um papel complexo. Assume uma Evelyn extremamente bela e altamente
superficial porque nunca teve amor, nem de seu falecido marido e nem da filha.
Enxerga na chegada de Charlie uma
nova chance de ser amada e desejada.
Segredos de Sangue é um
excelente filme, mas um para minha coleção de ouro, repito é uma obra-prima,
digna de indicação a prêmios. Recomendadíssimo!!! Chan-Wook estreou
com máxima expressão, seu filme é antes de tudo um limiar entre angústia
e moralidade, ou até onde vai a normalidade, o instinto humano. Houve críticas
amistosas sobre o longa, mas isso é devido ao costume de se assistir filmes
recheados de sangue e sexo, deixando de lado a arte. O cinema é poético, há
filmes de ação, terror, drama, etc. que são pura arte, e Chan-Wook veio mostrar que ele é um destes raros diretores que
sabem fazer cinema com estilo, garbo e elegância.
A outra
linha tênue de Stoker é buscar a
compreensão do humano. O que nos faz humanos? Será que podemos deter a natureza
de alguém? O filme nos mostra como enxergar o incômodo do que é inevitável, ao
atentar a um tio sedutor e misterioso, a perda da ingenuidade ao expor India experimentando duas bolas de
sorvete após descobrir um cadáver no freezer, ao simples toque de pele que
desperta uma paixão e a verdade inconveniente de que não podemos esconder quem
somos. É como India afirma: “assim
como a flor não escolhe sua cor, não somos responsáveis pelo que viemos a ser”.
Bjossss! Até a próxima!
Janiê Maia McCartney
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