quinta-feira, maio 16, 2013

O Poderoso Chefão - Francis Ford Coppola, por Michel Euclides

Michel 127, Dia 136.

Num mundo cada vez mais amoral, onde criar seus filhos e cuidar de sua família torna-se uma tarefa cada vez mais complexa e quase sempre heroica, o mundo idealizado por Mario Puzo e transposto para as telas por Francis Ford Coppola - apesar de acontecer entre as décadas de 1940 e 1950 - retrata de maneira atual e realista, reproduzindo com violência e fidelidade o mundo cruel, duro e cínico em que vivemos.



Vito Corleone veio para a América fugindo da máfia siciliana ainda garoto, para salvar a vida. Crescendo em Nova York, Vito viu a cidade crescer em poder e criminalidade. Casou-se jovem, iniciando uma família à qual se dedicaria incondicionalmente até sua morte. Silencioso, Vito viu-se participando de pequenos crimes e vendo sua vida melhorar, até sentir-se ameaçado naquilo que lhe era mais valioso - a segurança de sua famiglia. Tomou a decisão de sumir com aquele que lhe punha a vida em risco, iniciando a escalada de poder que o transformaria num dos senhores de Nova York: um Don. Don Vito Corleone.



Pai de Sonny, Fredo, Michael, Connie  e Tom Hagen, Don Vito tornou-se um homem importante e influente. Do alto de sua maturidade, tem seu poder concreto, influência e amigos. Sua famiglia agora engloba todos o que trabalham para ele - do mais baixo bookmaker ao seu Consiglieri, seus Capos e seus soldati. Don Vito trata a todos os seus amici com respeito e honra, fazendo-os sentirem-se importantes e únicos.

Ainda silencioso, ainda letal, mantém seus amigos perto e seus inimigos ainda mais perto. Sabe que a vida humana só vale a pena ser vivida quando é uma vida honrada, e baseia suas relações em confiança e virilidade - qualidades cada vez mais ausentes no mundo de hoje. Ser um homem é a coisa mais importante que alguém pode ser, e isso envolve, acima de tudo, honra, fidelidade e dedicação à família acima de tudo.

"Mulheres e crianças podem ser descuidadas, homens não".
Don Vito Corleone

"Um homem que não se dedica à família jamais será um homem de verdade." 
Don Vito Corleone.

Os filhos de Don Corleone são radicalmente diferentes entre si. Santino "Sonny" Corleone é explosivo e impulsivo, dono de uma agressividade visceral. Frederico "Fredo" Corleone é apagado e só segue ordens, extremamente ressentido por ser sempre deixado em segundo plano.  Constanzia "Connie" Corleone é mulher, e deve ser submissa a seu marido e cuidar de seus filhos - apesar de ter um gênio forte e explosivo; Tom Hagen é frio e impessoal, filho adotivo, Consigliere de Don Corleone; e Michael "Mike" Corleone, que renega o "negócio" da família por não acreditar na linha de trabalho do pai, apesar de admirá-lo.

O desenrolar da história nos mostra que há um novo "mal" se espalhando na cidade, e uma oportunidade de negócios que trará rios de dinheiro àqueles que se envolverem. Os negócios comuns da família são o jogo ilegal, a prostituição e a influência política para os favores dos amici - mas agora os entorpecentes estão tomando conta das ruas, trazendo um novo tipo de violência, que não leva em conta os valores como honra, respeito e fidelidade.

Sollozzo, o Turco, pede para Don Corleone proteger o negócio de heroína da família Tattaglia. Don Corleone se coloca contra essa iniciativa, mas Sonny se interpõe na conversa pensando que talvez esse possa ser um negócio vantajoso para os Corleone, mostrando uma dissonância no pensamento dos dois que enfraquece a postura da família.

A consequência desse encontro surge na brecha que se insinuou entre as diferenças de pensamento expostas entre Sonny e Don Vito, resultando numa tentativa de assassinato que vitima o patriarca dos Corleone.

Don Vito sobrevive, mas, frágil, interna-se num hospital. Os inimigos da família se unem e, através de ardis, tentam finalizar o que iniciaram sumindo com os guardas do hospital. Michael, que ia visitar o pai, percebe que o mesmo está desprotegido e imediatamente toma medidas para resguardá-lo - medidas estas que colocam em risco sua própria vida. 

Michael é agredido por McCluskey - um policial corrupto a serviço do Turco - e leva um soco que lhe quebra o lado do rosto. Neste instante, pessoas de confiança da família chegam para proteger Don Corleone e salvam a vida de Michael. Sonny assume temporariamente a chefia e mata Bruno Tattaglia como vingança.

Sollozzo e Tattaglia buscam entrar em acordo pedindo paz, e Michael se oferece para ir. Encontram-se num restaurante e, após fingir ir ao banheiro, ele os executa e sai do país rumo à Sicília, onde ficará até que as coisas se assentem.

Enquanto Michael está na Sicília, Sonny é emboscado e morto numa das cenas  de execução mais cruas da história do cinema. 



Na Sicília, Michael se apaixona por Apollonia Vitella e se casa. Sua felicidade dura pouco tempo, pois ela é assassinada após um atentado à bomba que tinha como alvo o filho caçula de Don Corleone.

Após tantas perdas, Don Vito parte para a negociação da paz, garantindo o retorno em segurança de Michael aos Estados Unidos. Algum tempo depois, Don Corleone se "aposenta" e passa à Michael a liderança da famiglia.

Michael avisa a todos que está pensando em mudar as operações da família para Nevada - os cassinos! - e fica extremamente decepcionado quando Fredo apóia Moe Greene - dono do cassino que Michael quer comprar - e fica contra a família. 

Algum tempo se passa, e numa manhã fresca e bela, Don Corleone morre em paz, em sua plantação, enquanto brinca com o neto. 

Trecho do livro, que descreve uma das maneiras mais bonitas de morrer: 




"A vida é tão bonita..."

Após a morte de Don Corleone, Michael coloca em prática seus planos. Inicialmente desconfiados, os membros da família aceitam Michael como Don após este mandar executar todos os outros Dons rivais e acertar contas com os traidores Carlo Rizzi - seu cunhado - e Tessio, um dos Caporegimes.

Esta é uma das cenas mais impactantes do filme, quando todos reconhecem o valor de Michael. Ele deixa de ser Mike, o caçula, e passa a ser chamado de Don Michael Corleone.




*      *     *


Há pequenas histórias aqui, entrelaçadas, e eu não quis contá-las para não tirar o foco da história principal e da questão que é o cerne aqui: honrar a família, dedicar-se aos filhos, construir sua própria história. Há de se questionar o fato de Don Corleone ser um assassino, criminoso, comprador de políticos, mas a ideia aqui é: ter um código de honra a seguir. Colocar-se  perante a vida como um homem, não como uma vítima. 

Fazer o que precisa ser feito, sacrificar a si mesmo pela família. Não é todo mundo que consegue fazer isso, nem que consegue pensar assim. Há pessoas que são incapazes de abrir mão do que chamam de "meus valores" e fazer o que é necessário, limitando-se preguiçosamente por uma noção estagnada e antiquada de bem e mal.

Don Corleone, o personagem central da saga da família Corleone, matou, mandou matar, roubou, espancou, intimidou, explodiu, mentiu, manipulou... mas tudo em nome daquilo que acreditava. Não pensem aqui que faço uma apologia ao crime ou à violência - não acredito nisso. Acredito na inteligência e na racionalidade, mas também sei o quanto podemos ser sujos e doentios. Aceitar o que em nós é sombrio e sanguíneo e tentar enxergar além de estruturas mentais vencidas, isso nos torna pessoas melhores.

O que aprendemos com Don Corleone? Eu só posso falar por mim. Se você não assistiu o filme ainda, ou não leu o livro, não perca tempo. Honre o trabalho mítico do senhor Coppola e do senhor Brando, e do senhor Paccino, e do senhor Puzo - e de todos os envolvidos direta e/ou indiretamente com este filme - e veja, viva, reflita num dos maiores filmes de todos os tempos, um clássico dos clássicos, um dos poucos filmes capazes de mostrar a um homem como viver e como ser homem.

Encerro a postagem - uma das minhas mais longas - com este que é um dos movie themes mais poderosos de todos os tempos. Boa noite e até a próxima.






P.S.: Felipe Pereira, tava te devendo algo desse nível. 

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