segunda-feira, setembro 22, 2014

Veneer (2003) - José González, ou: Sementes do desejo de partir


“Veneer” é o disco de estreia do cantor/compositor sueco José González. Lançado em 2003, temos González nos vocais, violão e percussão – e isso é quase tudo o que se sente/ouve em suas músicas. Mas não é tudo o que se vive.


Pode-se perceber a influência Silvio Rodriguez em seus violões selvagens e imprevisíveis, mas González imprime em sua música uma de suas características mais marcantes: a necessidade de estar em vários lugares ao mesmo tempo, nunca preso, mas diluído no espaço-tempo infinito.


A música de González tem o poder de te jogar nas imensidões, nos amplos espaços abertos que se colocam entre as cidades sob o céu azul. Em meio a questionamentos e incertezas, cada passo que se dá é rumo ao que há, no futuro, de esperanças e promessas – mesmo quando se sabe que cada uma dessas promessas há de ruir ante a passagem do tempo.

Ele se plenifica em seu exercício de exprimir-se. Suas vozes unem-se aos violões de cada faixa com uma certeza tão orgânica que é impossível separá-las. Sua música (assim como a de Rodriguez) é de uma qualidade onírica. Nela, as paisagens noturnas cruzam-se com horizontes diurnos. Na vertigem das luzes, sol e lua cruzam-se com a violência de uma ressaca marítima enquanto González povoa nossa alma com seus seres de pensamento e som.

Do álbum todo destaco todas as faixas. O sentimento de González invade cada uma delas e transforma-as em orações atravessando o mítico silêncio das eras incontáveis. Talvez o som do Monólito Negro, ou a canção de uma sereia imortal, ou ainda o choro do bebê condenado à morte antes de nascer. As palavras emanam em parceria com a melodia e viajam em busca do nosso silêncio interior, reverberando violentamente nas paredes falsas que nos revestem. Nossas fragilidades são, então, expostas com violência e sutileza, e o sangue ralo brota, quente, úmido, ferroso e anêmico, por entre as brechas e rachaduras que surgem – consequências do desgaste pela rotina.

“Veneer” torna-se, então, caminho/lugar obrigatório de peregrinação daquele viajante que não teme as promessas do horizonte – ou que não se encolhe diante da infinitude dos dias que se deitam em potência diante de nossos pés. É um álbum para se ouvir sozinho, pois que ele cria sementes de desejo de partir – mas não as justificativas. Essas já estão aí, dentro de você, esperando para brotar e lançar suas galhas, folhas e frutos por entre as rachaduras de tua superfície perfeita e brilhante.

Selo "Amplidão" de mundo véi sem porteira para o disco que consegue te assanhar pra sumir no horizonte.

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