quarta-feira, setembro 04, 2013

As Aparências Enganam - Ney Matogrosso, ou: Legado

Dia 247.

Lembro com carinho de minha pré-adolescência os momentos que eu passava conversando com meu pai sentado na porta da sala enquanto ele tomava, lentamente, nas manhãs de domingo, suas doses de Rum.


Conversávamos sobre tudo: Deus, mulheres, amizades, futuro, medos, inseguranças, músicas e livros... sobre o passado e os erros que ele cometera - e os que eu, porventura, cometeria quando saísse da redoma que eles - meus pais - haviam construído para nos prender proteger de todo o mal amém.

Eventualmente eu saí de casa e cometi muitos erros. Alguns dos quais meu pai previra, pois eu sou tal e qual ele em alguns aspectos - e isso não é bom nem ruim, eu acho. É apenas fato. Seja por isso ou não, escutando de novo este disco "As Aparências Enganam", do Ney Matogrosso, lembro-me com muita saudade daquelas manhãs.



Ele comprou para me dar este cassete. Lembro que a o corpo da fita era transparente, escrito com letras brancas, e tinha parafusos pretos. Lembro do encarte mínimo que vinha dentro da caixa, e do cheiro do papel e da tinta. Lembro de viajar, aos doze anos de idade, ouvindo a voz única de Ney cantar pérolas da MPB - Chico Buarque, Caetano, Milton Nascimento, Ednardo, Alceu Valença, Tunai -  com maestria e domínio e sentimento. Claro que, naquela idade, eu de nada sabia. Hoje sei bem mais de teoria, mas, de sentimentos e intuição, à época eu era mago, rei, assassino e bardo.

Quase vinte anos depois paro para ouvir o disco de Ney e resenhá-lo, e as lembranças me inundam. Mas diferente daquelas lembranças que você tinha de quando criança, as músicas, os arranjos e o talento de Ney resistiram à passagem do tempo. As canções continuam atuais e modernas, soando originais e fortes. Cada uma delas conta uma história, e Ney apropria-se delas para contar segredos e verdades que outros artistas talvez não conseguissem com tanto desejo e paixão e simplicidade.

Neste disco ele conta com o grupo Aquarela Carioca dando-lhe o apoio necessário. Suas atuações são contidas mas cheias de espírito, tomando de conta do recinto e da alma de quem escuta sem esforço.




Minha preferida? O pout-pourri de Cirandas. A coisa mais linda. Só vim ter emoção similar quando ouvi Lenine cantando "Ciranda Praieira".



Não conhece ainda? Aproveite e venha ouvir. Apaixone-se também. Quem sabe um dia você não consiga escutá-lo com seus rebentos e diminuir um pouco a fria distância que há entre pais e filhos? A música é uma excelente maneira de fazer a ponte entre as gerações. Eu sei disso, pois meus filhos ouvem música desde o ventre da mãe. E eles adoram.

Tenham todos uma boa noite.

Abraços!

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